Responsabilidade Social • 13:51h • 02 de dezembro de 2025
Violência digital contra mulheres: saiba o que é e como se defender
Tema da campanha 2025 dos “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher”, os ataques digitais contra elas reforçam a necessidade de regulação das plataformas no Brasil
Jornalista: Carolina Javera MTb 37.921 com informações da CUT | Foto: ONU/Divulgação
A violência digital contra meninas e mulheres cresce em ritmo acelerado no mundo, somando-se às agressões físicas, psicológicas, sociais e econômicas já existentes. Celulares, redes sociais e tecnologias viraram novos instrumentos de ataque, perseguição e silenciamento. Em 2025, o tema é destaque da campanha global da ONU “UNA-se para Acabar com a Violência Digital contra Todas as Mulheres e Meninas”, realizada durante os 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres.
No Brasil, a mobilização conta com apoio da CUT, de movimentos feministas, organizações da sociedade civil e do poder público, chamando atenção para um tipo de violência que cresce rapidamente entre o público feminino.
Os 21 dias
Globalmente chamada de “16 Dias de Ativismo”, a campanha da ONU vai de 25 de novembro a 10 de dezembro. No Brasil, começa em 20 de novembro para destacar as interseccionalidades entre machismo e racismo, já que mulheres negras são as maiores vítimas de agressões e feminicídios. O recado é claro: se a vida acontece também no ambiente digital, a proteção às mulheres precisa acompanhar essa realidade.
Segundo Amanda Corcino, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, a violência digital está ligada às desigualdades estruturais. “A raiz desse problema está na forma como a sociedade enxerga as mulheres: corpos objetificados, pessoas desrespeitadas em seus espaços e com acesso limitado ao poder”, afirma.
Para ela, o ambiente virtual facilita ainda mais a ação dos agressores: “Se a covardia já acontece na vida real, no mundo digital é ainda mais fácil praticá-la”.
Um ambiente sem regras
Antes percebido como espaço de liberdade, o ambiente digital se tornou terreno fértil para ataques. Os abusos vão de insultos a ameaças, passando por:
- Assédio sexual e moral
- Vazamento de imagens íntimas
- Deepfakes pornográficos
- Cyberbullying e discurso de ódio
- Perseguição e controle digital (cyberstalking)
- Exposição de dados pessoais (doxxing)
- Golpes com perfis falsos (catfishing)
- Sextorsão
- Monitoramento ou controle de dispositivos
Deepfake é uma técnica de inteligência artificial que cria conteúdos falsos, mas realistas. Entre 90% e 95% dos deepfakes publicados são pornográficos e não consentidos, e até 99% retratam mulheres. Entre 2019 e 2023, o volume desse tipo de vídeo cresceu 550%.
As consequências ultrapassam o ambiente on-line. “Essa violência não acaba quando a tela se apaga. Ela atinge a vida, a saúde mental e o trabalho das mulheres”, diz Amanda.
Quem mais sofre
Os dados globais são preocupantes:
- Entre 16% e 58% das mulheres já sofreram violência digital
- 38% relatam assédio online
- 73% das jornalistas recebem ataques virtuais
- Uma em cada três parlamentares recebe ameaças
Quando gênero se cruza com racismo, LGBTfobia ou xenofobia, a violência aumenta. “Essas discriminações somadas tentam impor silêncio às mulheres”, aponta Amanda.
Um cenário brasileiro agravado
Estudo do Ministério das Mulheres e do NetLab/UFRJ identificou 76,3 mil vídeos misóginos no YouTube entre 2021 e 2024, que juntos somam mais de 4 bilhões de visualizações.
No mesmo período:
- Feminicídios subiram de 1.347 (2021) para 1.463 (2023)
- Violência doméstica e familiar cresceu quase 10% (2022–2023)
Dados da Pesquisa Nacional sobre Violência contra a Mulher – DataSenado 2025:
- 3,7 milhões sofreram violência doméstica no último ano
- 10% sofreram violência digital
- 2% foram chantageadas com imagens íntimas (o dobro de 2023)
- 79% acreditam que a violência contra a mulher aumentou
- 70% consideram o Brasil “muito machista”
A violência é duradoura: 58% das vítimas sofrem há mais de um ano. Em 71% dos casos, houve testemunhas — e, em 70% deles, crianças estavam presentes.
Plataformas que falham
A situação se agrava quando as redes reduzem a moderação. A Meta flexibilizou recentemente suas regras alegando “liberdade de expressão”, o que ampliou a circulação de discursos misóginos e desinformação.
A pressão internacional trouxe avanços:
- Pacto Digital Global da ONU (2024) — padrões para segurança digital e IA
- Convenção de Cibercrime da ONU (2024) — primeiro instrumento global para enfrentar violência digital
- Resolução da ONU (2024) — exige responsabilização das plataformas
No Brasil, leis reforçam a proteção:
- Lei 14.192/2021 — combate violência política de gênero
- Lei 14.188/2021 — tipifica violência psicológica e stalking
- Lei Maria da Penha — projetos buscam incluir violência virtual
- Atualizações recentes agravam penas quando há uso de IA para criar deepfakes
Campanhas públicas e a rede de proteção — como as Delegacias Especializadas (DEAMs) e orientações do CNJ — também auxiliam.
Para Amanda, ainda falta regulação robusta. “Sem regras claras, o ambiente digital vira porta aberta para o ódio. As plataformas precisam impedir e remover conteúdos violentos e excluir usuários que os produzem”, defende.
Como denunciar e se proteger
Diante de ataques, a orientação é denunciar e registrar tudo. Os principais canais são:
- Ligue 180
- Delegacias da Mulher e de crimes cibernéticos
- Ferramentas de denúncia das plataformas
É importante:
- Guardar provas (prints, links, datas e horários)
- Buscar apoio psicológico
- Reforçar senhas e autenticação em dois fatores
- Ajustar privacidade
- Ter cautela ao enviar imagens íntimas
Entidades como Safernet Brasil, ONU Mulheres e iniciativas como Take It Down ajudam na remoção de conteúdos íntimos.
Uma responsabilidade coletiva
Para Amanda, combater a violência digital depende de ação conjunta. “Precisamos construir uma cultura de respeito também no ambiente virtual. Cidadania digital não é opcional”, afirma.
A CUT participa da mobilização com campanhas, formação, negociações e apoio a políticas públicas. “A luta é para que nenhuma mulher enfrente machismo, misoginia ou desigualdade — nem na vida real, nem no mundo digital”, conclui.
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